domingo, 30 de maio de 2010

Quiproquó

Olho pro lado e não as vejo. Procuro atrás dos móveis. Nada de nada. As palavras fugiram. Todas, de todas as línguas, etimologias e origens. Fugiram de mim porque hoje não me desejam. Eu sou o risco de saias. E eu meto medo. Por isso, penso, as palavras fugiram. Assustadas. E foram sem asas - aliás, nem são aladas. Devem ter se ido correndo, com seus pés de palavras bem firmes no seu chão, suas linhas... As palavras fugiram. Me sinto órfã e também viúva. Não vou sofrer muito, nem morrer de desgosto, nem chorar horrores pela partida que fizeram, contudo. É domingo e as palavras mataram seu desejo de folga, fugindo sem aviso. Tiraram férias de mim e eu, resolvida e audaciosa, não vou esperar que voltem com a luz do quarto acesa. Gosto das palavras, tanto, que vou deixá-las fugidas pelo tempo que desejarem. E ainda dormirei em paz. Promessa! Não chamo pelo nome, não grito, não protesto. Finjo que acho graça na peça que me pregaram. Caso voltem por espontânea vontade, muito que bem. Mas que voltem no escuro e ainda tropecem nas exclamações. Que se atrapalhem, todas, que briguem e se esbarrem para conseguir retornar aos seus devidos lugares. O caso é que as palavras fugiram. Todas. E eu me sinto amarrada. Nelas, mesmo na distância. E na falta que me fazem. Devem estar zombando de mim, em algum lugar, na sua fuga, as benditas e benquistas. As palavras fugiram. Não me querem. Dançam ciranda nos meus pensamentos, se rearranjam, se acentuam, se dissolvem. Mas não voltam... Não, não voltam. Porque são tuas demais para que isso aconteça.

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