quinta-feira, 17 de março de 2022

The dark side

Desisti de pensar se sou generosa por altruísmo ou por ego. Eu gosto muito de ser boa. Entre outras coisas, porque isso me dá musculatura e crédito pra ser má quando preciso. Ou quando quero. Eu gosto de ser boa como gosto de mar: não sei explicar bem o motivo, eu só sinto que a vida faz mais sentido sendo boa, quando estou sendo. Mas sei que não sou boa o tempo todo. Aliás, longe disso. Eu sou feia também. Muito feia. Feia de doer. Eu penso mal das pessoas. E também penso bem. Luz e sombra. Eu gosto muito de fofoca no fim da festa, de dar resposta atravessada e venenosa, de ser franca o suficiente pra transparecer o meu pior. The dark side. E tudo bem. Porque sou complexa. Quebra-cabeça de zilhões de peças. Sobretudo porque ao ser complexa também vejo a complexidade dos outros, e aí me torno boa de novo. E me aceito controversa porque estou o tempo todo aceitando que tenho um histórico. Que já errei muito. Que preciso me redimir de mim mesma, comigo mesma. Sem reza. Sem satisfação. Sem nenhum moralismo. E se a verdade dos outros me parece absurda, ainda é uma verdade para os outros. Acho isso da maior bondade que há. Mas sei encher rápido os dedos de uma mão de gente a quem já fiz mal, por querer ou sem. E mesmo não me orgulhando disso, eu abraço as condições que eu tive para fazer as escolhas que já fiz, confiando que eram as melhores de todas naquele momento. E aí, você sabe: pensando assim eu sou boa de novo. Não tenho escapatória na bondade. É minha sina. Sou boa, muito boa, a melhor de todas. Dessa vez, comigo. Fiel à minha verdade e ao que há de agridoce em ser eu. Sou boa ao aceitar a imperfeição de todas as coisas, incluso de mim. Vejo isso pelo vão das minhas próprias rachaduras. Sou boa de entender as camadas do que me une a cada um que está ao meu redor. Boa de fazer quem está do lado crescer comigo. Boa de deixar pra lá. Boa de cativar sem que se entenda exatamente por quê, já que sou péssima. Já que sou boa em ser odiada, também. Açúcar e pimenta. Só vê bondade quem aguenta.