sexta-feira, 29 de junho de 2012

E ter, na vida, um ofício: Ser faísca.

Enquanto o mundo for mundo, haverá os dias em que quase tudo dá errado. Em dias como estes, a sua garganta voltará a doer, você será mal interpretada, e alguém terá a ideia - talvez inocente - de falar mais do que deve ao seu desfavor e a despeito das suas convicções. Acomete-lhe, então, um gostinho amargo de saber que o dia podia e devia ser melhor, de que podia ser diferente, embora isso não fosse exatamente um dever. 
É quando me lembro de francos sentimentos e de instantes amaciados com palavras e insinuações ternas. Quando eu recordo que, apesar dos pesares, ponderando as dúvidas, reconhecendo como muito sinceras algumas mentiras (que, como já disse o poeta, sempre interessam), talvez eu possa ser mesmo algo como uma faísca. 
E é provável que ser faísca seja mais do que a Wikipedia diz. Que seja mais do que ser parcela incandescente que se separa de um corpo que arde. Porque ser faísca, sei bem, também é arder. 
Arder com os enganos e desenganos que a vida traz, com o que podia ter dado certo e não deu, com o que ainda poderá dar certo e dispende paciências demasiadas pra que o fogo pegue, com o que enche os olhos de lágrima e quase apaga a chama. É arder de vontade de dizer aos quatro cantos que se arde. 
 E de repente, no fim da manhã, altas horas da madrugada, no meio da tarde... arde a vontade de entrar em contato pra dizer que é bom ter, na vida, um ofício: Ser faísca. Pra dizer que os dias em que se acredita ser faísca, os dias em que se aposta fielmente nessa possibilidade, são mais agradáveis que os demais. E compensam os momentos 'de menos', aqueles em que quase tudo dá errado.
Porque, como a definição assegura, ser faísca é ser uma parcela, apenas um fragmento, à busca de algo que lhe empreste sentido. Mas sem a simples parcela nada seria como é, e nada arderia como arde... Nenhum fogo teria graça se não produzisse faíscas. E nenhuma faísca teria razão de existir, se não houvesse a real possibilidade de reacender - e iluminar. 

sexta-feira, 22 de junho de 2012

Ele não está tão a fim de você

O título aí em cima, de um filme datado de 2009, resume a história. É claro que eu e você não somos Ben Affleck e Jennifer Aniston, por motivos práticos: eu e você não somos nada hollywoodianos. E eu também não sou a Scarlett Johansson, que atua no filme, já que eu realmente não tenho vocação pra gostosona, e já que se eu tivesse, o título a que me refiro certamente não faria sentido.
Então nosso elenco é mais modesto, e eu nem saberia dizer o nome de todas as personagens que já fazem parte dessa história. Ou que ainda virão. Mas é nesse enredo meio mal feito que você surge. De início, só às quintas-feiras à noite, depois aos finais de semana, em seguida ao meio-dia pra dizer que estou atrasada pro trabalho, e no fim pra adormecer antes de responder objetivamente a minha tentativa frustrada de facilitar as coisas sem te entregar o jogo. 
Falando em jogo, tem também a parte que você não dá a mínima pra eu ser uma garota que gosta de futebol, reforçando a minha obrigação de saber um pouco de todas as coisas, assim, in natura, pra me tornar um pouco interessante. 
O nosso filme tem você dizendo que "se empolgou" menos de um minuto depois de dizer que me quer, deixando o interesse velado ou, mais provavelmente, retirando-o de cena. E há a cena em que você usa terno e gravata. Mas essa eu prefiro nem comentar.
Ah, o filme. Já ia esquecendo. É a história de uma garota que espera uma ligação no outro dia - e o mocinho não liga. Não porque é mau, não porque tem alguém que o espera, não exatamente porque tem gente mais interessante na jogada, não propriamente porque quando as mocinhas demonstram interesse os meninos desencantam. Não porque ele é ocupado demais como faz parecer, nem especificamente por nada que se possa descobrir. 

Apenas porque ele não está assim tão a fim da protagonista, não importa muito o que ela faça. 

O final da comédia romântica - que agora empresta seu próprio título pra mais alguns parágrafos coesos e concisos, mas muito desnecessários - tem mocinho e mocinha se beijando. Final feliz!
Exatamente como devem ser as comédias românticas.
E se além das telonas não há final (pois há bem mais que cento e vinte minutos de história), não havendo possibilidade de este mocinho e esta mocinha ficarem juntos nenhuma vez... bom... ainda assim, as mocinhas podem descobrir, em dado momento, que sempre haverá outros risos. E outros enredos. E muitas outras pessoas.
Exatamente como devem ser as mocinhas da vida real.


Esse texto deixou de fazer sentido às 12h20min.
Mas achei que seria uma pena excluí-lo.

segunda-feira, 18 de junho de 2012

Do que foi feito pra dar errado

A gente insiste, é instintivo. Queremos provar ao mundo que podemos, sim. Que somos diferentes. Que temos as rédeas e que somos donos de nosso próprio destino. Não importa o quanto a consciência diga: "Para, porra!". Não importa quantas vezes a gente perceba que não podemos, que nunca somos, que nunca teremos.
Nós vamos lá e arriscamos. Fazemos, experimentamos, dizemos pra depois nos arrepender, deixamos ser. Quase sempre porque somos jovens, ou porque já somos experientes o suficiente pra saber como devemos agir, ou porque nunca se sabe quando a vida acaba, ou porque temos todo o tempo pra se arrepender, ou porque a vida é de quem se atreve. E principalmente porque tudo isso não passa de um pretexto pra esconder a esperança de que algo inspirador aconteça.
A gente sabe que é furada, que é mais do mesmo, que vai dar vergonha ter feito e dito e quebrado a cara - mas deposita todas as fichas, mesmo assim, quase sem querer. Por dois minutos de euforia ou talvez um pouco mais. Pela sensação de estar vivo. Pela novidade. Porque até acabar terá valido a pena. E o desgosto de depois do fim, é claro, deve ser o preço. O preço do que foi feito pra dar errado, a despeito das nossas insistências.
Abençoados os que travam na hora H, os que pensam mais de uma vez e antes, os que não trocam o certo pelo duvidoso, nem jogam tudo pra mais alto do que conseguem recuperar. Abençoados os que invejo, pela imensa coragem de serem grandes patifes - e não se machucarem pela vida que escolheram levar.

sábado, 9 de junho de 2012

Hoje eu entendi: Sonho não se dá.

Acho que, quando me inventaram, 
exageraram tanto na dose do 'complicada' 
que eu acabei ficando sem a parte do 'perfeitinha'.

Reescreveu rindo mentalmente, embora ele não visse. Dizer aquilo era um atestado de sinceridade muito maior do que o necessário para a ocasião. Era confissão. "Atenuante da segunda fase da dosimetria penal". Mas que podia fazer, se era verdade? Um deletério doce.
É, fazia frio. Não que isso importasse muito - mas há sempre que se dizer algo sobre como os dias foram cinzentos ou ensolarados, ou as madrugadas fizeram tremer, pra que o texto ganhe uma conotação poética, própria dos pseudo escritores de gaveta que escrevem para encontrar respostas. Própria de quem sai com os amigos, pro cinema ou pra beber pra encontrar respostas.
Talvez procurasse respostas que, por óbvio, ele não tinha. Ele era apenas o cara mais descolado que se tem notícias, e com muitas, muitas, muitas garotas na agenda telefônica. Mas uma só na marca de 3x4 da carteira. O cara que passava longe de ser propriamente underground, mas ficava o cúmulo do absurdo de jaqueta preta e as bochechas vermelhas. O cara que achava que sabor de morango artificial parece balinha de freegels. E que não encarava quem andou uns quilômetros pra ver, por nada nesse mundo. Orgulho? Respeito? Timidez? Não sabia. Ele não se deixava desvendar.
Mas ele estava ali outra vez. E isso quase não podia ser verdade. Assim, de graça!? Sem esperanças ou um beijo de verdade, de deixar confuso, na despedida!? "Melhor não pecar pelo excesso", diriam os sábios. E se de sábios não temos nada, melhor nem arriscar num teatro ensaiado de olhar pro celular e soltar um 'não-sei-quem-é,-sei-sim', fingindo as piores dúvidas e negando as realidades mais óbvias...
Melhor sermos humanos, e sinceros.
Esperou-se um sinal de vida, com instintos praticamente maternais, com todas as luzes acesas e piscando. Mas os sinais devem ter sido mais sutis do que ela fora capaz de compreender. Ou tenham sido ofuscados. Ou simplesmente não tenham existido.

Se todo o frio pudesse congelar uma cena, seria essa: Haveria uma garota em pé com as pernas cruzadas, uma garrafa de ice de gengibre na mão e um milhão de confusões a menos de meio palmo de distância. Que ficou ali, inerte, imóvel, parada, e todos os sinônimos mais. Por pura confusão.
Talvez você diga que não adianta apostar em algumas pessoas, nem romantizar histórias que a gente sabe que não devem dar certo. E que há tempo pra tudo! Talvez eu concorde, pensando que se Exupéry visse a cena, acreditaria mais do que nunca que quando o mistério é muito impressionante, a gente não ousa desobedecer. (Por mais absurdo que aquilo me parecesse a mil milhas de todos os lugares...)