quarta-feira, 19 de junho de 2013

A negligência da espera

Detesto pessoas irresponsáveis. E negligencio todos os meus prazos, sem exceção. Já negligenciei, com frequência, todas as minhas urgências, das fisiológicas às mais requintadas e metafísicas. O que, a bem da verdade, é bem detestável da minha parte. A esse respeito, eu não me compreendo.
Talvez eu passe a noite produzindo um trabalho semestral - que, claro, deixei pra última hora. Vai ser um dos melhores. Do contrário, terminaria amanhã de manhã. Mas quem se importa? Em alguns anos não me lembrarei do que estou escrevendo, sintetizando e produzindo na noite de hoje. Meses, quem sabe? Semanas? Dias... (em que tudo muda)
O tempo passa. Tudo passa. Deve haver uma tradução do ditado para qualquer idioma. Uma verdade universal, porque o tempo é sempre importante. Ele não tem distâncias, cor, geografia.
Se começa a chover, o clima importa também. Tenho frio. Talvez eu ponha o pijama e me renda às cobertas e ao sono depois dessa pausa estratégica. E dramática. É uma pausa que converge para as duas coisas.
Talvez porque o celular tenha tocado (só) pra me avisar que o dia foi corrido. Dia corrido é sempre um eufemismo para quero desculpas antecipadas pela culpa que penso não ter, já que o meu dia foi corrido. Um dia corrido é uma redundância prolixa (porque ecoa através dos pensamentos) que reduz a si mesma, dada a brevidade do anúncio e o pouco caso, aos trapos.
Esperar não faz o tempo correr. Esperar desacelera. E eu? Eu vivo esperando.
Os prazos acabarem, os tempos passarem, as pausas dramáticas se extinguirem, os irresponsáveis compreenderem que meu ódio é solidariedade, as frases de efeito perderem o sentido. A negligência da espera se converter em trezentos e sessenta e cinco parcelas anuais de dias corridos que não impeçam. E alguém que me sinta (bem) à la Closer : Entre tudo e tantos, pela integralidade do que dói em mim.

segunda-feira, 3 de junho de 2013

Incompreensível


Cheguei em casa, amarrei os cabelos que já tinham um arco de bolinhas e lacinho, vesti uma blusa de lã cor de rosa por cima do vestido e fui fazer sanduíches de vestido preto, meia cinco oitavos, blusa de lã cor de rosa, arquinho e cabelo amarrado. Talvez eu estivesse de pantufas, não lembro bem. Era uma cena poética de tão patética. Eu costumo ter dó de poucas pessoas, mas naquele momento eu tive dó de mim. Por nada.
Às vezes eu sofro sem motivo. Acho mesmo que tenho vocação. Isso vem me acontecendo com frequência. É bem verdade que eu detesto o estereótipo de chorona. E nunca ele me coube tão bem. Ontem eu desembarquei do carro e chorei apoiada em uma das colunas do terminal, e por mais que me esforce, não sei dizer porquê. Eu tinha em mim todas as dores do mundo naquela partida. Não tardou pra que o carro arrancasse, levando-o pra cada vez mais longe. De um jeito que, uma vez mais, eu não sabia aceitar.
Queria tanto saber agradecer o que eu tenho de bom. Quero tanto me satisfazer de verdade com isso, sem fantasiar que os (pequenos?) problemas que tenho são culpa de coisas mal resolvidas na minha história, que nunca poderão sarar, porque estão em um tempo que não volta.
Saber seguir, como eu já soube um dia. Saber apostar como eu já soube um dia. Queria tanto saber deixar pra trás com mais facilidade. Queria tanto ser mais leve. Queria tanto viver avante. Mas todas as pequenas decepções e alegrias ainda moram em mim de alguma forma. E como pesam! E como me atravancam!
Acho que deixei de ter o riso franco e fácil, na véspera de quando a inquietude se instalou em mim. E chorar não resolve nada, eu sei. E formular hipóteses, solitária, não altera a trajetória dos destinos. E são poucas, nesse mundo, as pessoas altruístas o suficiente pra deixar suas vidas de lado por cinco minutos pela dedicação de cessar um choro. O que, na verdade, é bem compreensível.
Quero me dar sossego e não esperar que algo extraordinário aconteça pra que eu volte a ser bem feliz.  Porque talvez nada de mais extraordinário vá acontecer. Porque talvez o que há de mais extraordinário se revele em pequenos gestos que não sei reconhecer e significam muito. E quero reconhecer, mas não sei como.
Quero compreender que não devo ser derrubada à toa, que algumas pessoas podem valer minhas apostas, e que outras precisam de uma paz que talvez eu não ofereça mais. De uma paz que não me dou e que me cansei, muito cedo, de procurar. E choro de cabelo amarrado, arco de bolinhas, meia cinco oitavos, vestido preto. Embaixo das cobertas. Eu choro nua das minhas grandezas, choro despida de qualquer qualidade. Choro, criança sem rumo, as mãos fechadas em punho pra que ninguém mais se atreva a entrelaçar os dedos. O meu choro deságua vão, destemperado, incompreensível. Eu não sei o que me acontece enquanto entristeço em distância segura de um caminho mais cheio de luz.