quinta-feira, 20 de agosto de 2015

Por dentro

"[...] Quando eu te encarei frente a frente não vi o meu rosto
Chamei de mau gosto o que vi, de mau gosto, mau gosto
É que Narciso acha feio o que não é espelho
[...] E foste um difícil começo
Afasta o que não conheço
E quem vem de outro sonho feliz de cidade
Aprende depressa a chamar-te de realidade
Porque és o avesso do avesso do avesso do avesso"
(Caetano Veloso)

Tentei te sensibilizar, declarei o afeto depois de tudo acabar. Injustiça a tua, amor. Mesmo longe serás fogo, fogo, fogo. Coisa assim não acaba cedo, mulher. Vejo arder em ti algo que não compreendo, mulher. Eu sei que sentes tudo e estás sentindo algo inconsequentemente e violentamente agora. Não sei o quê e tudo se confunde. Tu sabes? Cadê aqueles instantes onde alucinadamente pensávamos que era tudo empatia e sincronia? Por que tão verdadeira? Por que palavras tão duras? Qual das coisas que não fiz te fez partir? Serás sempre o que quiser, mulher. Isso me ofende e me escondo, menino, nas asas da vida. Tu partes, encolho. Essa ideia de amor aprisiona. Como é que vais embora com esse coração tão leve, se dizes amar? Baixa a cabeça e cala. Não atacas, não revidas, não tentas me atingir. Segue firme. Que humildade é essa, mulher. Quero estrafego: maldizer o nosso lar, sujar teu nome, te humilhar. Só sei sentir assim. Vê de quanta atenção eu preciso, nota a ferida aberta arder e me explica de onde é que surgiu essa certeza tão grande de que não somos um par. O que é que eu faço se achei que dependia, Narciso, da tua coragem e valentia pra me ver no espelho? É outra boca? Outro corpo, outro coração? Não? Como assim não, mulher. Mas que raios, mulher! Sem me trair, sem duvidar, sem pestanejar, compreendendo tanto de mim e nada de nós. Acordaste hoje, fincaste o pé na estrada e nunca mais. Bruxa na fogueira, máscara caída, algoz da profana inquisição. O diabo suspira com o trabalho que tem a cada vez que respiras.

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