quarta-feira, 5 de agosto de 2015

Não é você, somos nós.

Hoje eu vou escrever sobre pedra nos rins. Sim, é o segundo tema "patológico" em dois dias. Não, eu não estou com problema nos rins. O inferno astral não chega a tanto. Que eu saiba, só com gripe. Mas eu acho que o meu cérebro está com uma certa disposição pra essas metáforas ruins. Vai ser um desabafo, tá? Nada de uma pretensa vertente poética, como sempre, ou algo assim. É provável que eu leia esse texto em algumas semanas e sinta que estou dizendo a mesma coisa que ontem, mas com menos floreio. Se eu tivesse um vlog, seria uma conversa franca com a câmera. Mas eu tenho um blog. Porque é quando escrevo que sou inteira.


Há um tempo eu tive cálculo renal e é uma dor absurda. Não consigo lembrar exatamente quantos meses faz. Eu sinto necessidade de contar que essa dor surgiu do nada sempre que falo a respeito. Um dia eu acordei, manhã cedo, sentindo dor. Claro que do nada é modo de dizer. A pedra já estava lá, era produto de uma predisposição genética e do quanto de sal eu como. Como num cálculo matemático: os problemas nunca são só aquele problema específico, mas um conjunto de elementos problematizadores.
Parecia tudo bem comigo, exceto pela pedra que começou a se mover no canal. Mas então a pedra já estava lá desde antes, certo? Certo. Uma pedra assim não se forma em oito ou nove horas de sono, só que eu só me ative a ela quando perturbou. Pedra no rim dói muito. Dizem que mais que parto. A crise passou, mas eu me lembrei semanas do quanto me contorcia e do quanto era incômodo. Se me esforçasse, podia sentir o canal machucado um mês depois.
Eu gosto muito de sal. Eu acho que amo sal. Mesmo, de paixão. Borboletas no estômago. Quando eu vejo um saleiro na mesa eu fico contente (vai entender!?). Parece identificação de outras vidas. Contudo, absolutamente todos os dias depois da minha primeira crise de cólica de rim eu precisei fazer uma escolha. Porque eu amo sal, mas a minha razão sabe que eu posso criar novas pedras no rim. E que, quando resolve incomodar, pedra no rim dói pra caralho.
Quem me diz que eu preciso comer tudo insosso em nome da minha saúde não faz ideia do quanto o sal me faz falta. E quem me diz que eu devo comer sal o quanto quiser porque um dia morreremos todos não sabe o quanto dói a porcaria da crise de cólica de rim. E, todos os dias, ninguém pode fazer essa escolha por mim. Eu não acredito que deva problematizar as coisas mais do que elas já são problematizadas, mas ainda não aprendi quanto de razão e quanto de coração a gente deve empregar em cada coisa. Não acho mesmo que alguém saiba a medida ideal.

Não é você. Não sou eu. Somos nós: essa indecisão crônica a ser tomada entre o que nos machuca e sensibiliza. Essa necessidade de manter uma distância das emoções pra conseguir raciocinar. Essa necessidade de se deixar compadecer junto, pra não endurecer demais. Essa impossibilidade de apartar as dores e trancá-las, longe das expectativas. Essa dificuldade de viver o presente e não pensar no futuro, se foi o passado, o amor, o sal - e também as pedras e as dores - que nos trouxeram até aqui.

Nenhum comentário: