quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

"O que 'cê vai querer ver, quando você voltar a ver?"

No fim do mês de janeiro minha mãe me enviou um texto chamado "A menina quebrada", que é o que eu acho que eu queria dizer hoje, traduzido de alguma forma (o texto está disponível aqui). Então suponhamos que essa publicação é só pra compartilhá-lo com vocês. Mas eu continuo escrevendo, aventureira na falta de maquiagem e de tato com as cruezas do que eu sinto. Ou só sendo transparente. Como preferirem.



Saí do trabalho cinco minutos mais cedo e foi bom refazer o caminho inverso de todos os dias com uma folga substancial no apressar dos passos. Agora estava cada vez mais próximo o fim dessas férias da faculdade... E a rotina, que tem seus benefícios imperceptíveis a olho nu, era aguardada ansiosamente pelos meus olhos cansados o suficiente pra ver vantagem no cotidiano.
Às seis e meia da tarde da quarta de cinzas, o sol que São Pedro pintou no céu azul com poucas nuvens já tinha se escondido. Passei em frente à escadaria da Catedral temerosa e de cabeça baixa, mas não vou explicar porquê. Não convém. É um detalhe que omito pela publicidade que, hoje, eu me dei conta que essas palavras têm. 
Só vou esclarecer que meu motivo nada tinha de muito religioso, e que até chegar à faixa de pedestres - com um sinal milagrosamente aberto pra mim - eu já tinha recobrado o fôlego de um susto que durou alguns segundos. Fiz uma prece particular pra que os meus pequenos medos parassem de vir ao meu encontro, de me seguir, de caminhar ao meu lado, de me surpreender na escadaria enquanto ando distraída pela calçada. 
Rezando baixo e respirando fundo numa intenção sincera de que as coisas melhorassem, eu cheguei ao Terminal. Muita gente se acotovelando, como de costume naquele horário. A dois metros, uma menininha linda, com um rabo de cavalo no alto de cada lado da cabeça, de uns dois ou três anos de idade, afastava-se da mãe (distraída pela conversa própria da espera) pra uma aventura: Subir sozinha no banco de madeira, em um espaço pequeno que acabava de vagar porque uma senhora tinha se levantado.
Eu quis repreendê-la com a minha voz grave, o mais alto que conseguisse, mas não pude interferir na cena. Era gente demais pra que eu atravessasse fileiras de pessoas na base do empurrão e salvasse a mocinha da queda. E ela podia nem cair, o que me faria zelosa além da conta pra alguém que nunca teve um instinto materno aflorado - quer porque não tive irmãos, quer porque não tenho sobrinhos ou afilhados. Mas pior que isso era a ideia de eu atravessar aquele mar de gente e, ainda assim, ela se quebrar.
O que eu diria pra aquela menina? Eu não sabia abraçar ninguém com a tranquilidade de uma mãe. Os meus beijos não curavam a dor de ralados no joelho. Eu não sabia lidar bem com os meus próprios machucados, lidaria bem com os daquela criança no primeiro instante do tombo, se esse fosse o caso? Certo que não.
Quando dei por mim ela estava sentada. Com todos os ossos em perfeito estado e também com todos os dentes. Sorri aliviada em minha inércia. Quebrada ali, só eu. De um jeito que ninguém mais via, é bem verdade. Crescida. Muito menos dura na queda do que desejava - mas mais forte ao suportar os ferimentos do que jamais esperei daquela menininha.
Quando eu voltar a ver as coisas como são, quebrada ou não, eu espero que o mundo ainda seja minimamente gentil com os que se permitem.

Um comentário:

Anônimo disse...

Maravilhoso!