quarta-feira, 20 de março de 2013

A estação do encontro

Não vou lutar contra o que eu sinto 
Vou me entregar como um soldado cansado e faminto

Não vou lutar contra o que eu sinto
Porque a verdade explode cada vez que eu minto 
Não posso mais viver em conflito 

Não vou negar o que é tão claro
Vou me entregar em tudo que eu faço
Em tudo que eu falo 

Não vou negar o que é tão claro 
Porque a verdade explode
Mesmo quando eu me calo 
(Não vou lutar - Titãs)



Agora é o outono. Sei disso porque sou boa o suficiente em matemática pra conhecer o resultado de doze meses divididos por quatro estações. Já se foram as semanas necessárias desde que o verão deu as caras. Soube que o outono chegaria quando comecei a fazer contas e planos pra ele. Mas saberia, de qualquer forma, quer pela dor de garganta e os indícios de resfriado que apareceram bem cedo, quer pela necessidade de sair da cama e buscar mais coberta pra conseguir adormecer tranquilamente aquecida.
Encerra-se a estação mais quente - que aquela marca de cerveja chama de estação da perdição nos comerciais, se a memória não me falha. Com razão, dessa vez. Meu verão foi intenso o suficiente pra fazer com que eu me perdesse, do início ao fim, embora raramente beba cerveja. Meu verão foi marcado por conquistas e reconquistas e desconquistas de coisas e pessoas bem e malquistas. E encerrou em si mesmo os planos sem razão para as próximas estações.
Foi o verão que me assistiu deixar os ombros à mostra e as coxas de fora, um palmo ou mais acima do joelho, em dias ou noites escaldantes que fizeram que eu comprasse um novo óculos de sol e um copo rosa de neon, conhecesse a chopperia de Lontras e a frente do Parque Botânico. Fez com que conhecesse One Day, Meia-noite em ParisVanilla Sky e, mais recentemente e em especial, 500 dias com SummerE eu me conheci, num dos maiores sustos de que tenho lembranças, sob o sol da primeira e última estação do hemisfério sul.
É bem verdade que algumas coisas duraram mais do que o verão merecia. Mas foi nesse mesmo clima que eu dei adeus a uma parte da minha irresponsabilidade e vi o segundo dente do juízo rasgar a carne, pra que as frações de tempo que me aguardam sejam encaradas com a sabedoria necessária. Ou, ao menos, com mais sabedoria do que já as enxerguei.
O verão viu cair a unha do pé que a primavera deixou roxa e observou nascer o trauma dos calçados abertos. Este mesmo verão que foi palco da inédita vez que andei de carona em um quadriciclo, da noite inédita em Balneário Camboriú sem-pai-nem-mãe, das inéditas cólicas misteriosas que me fizeram vomitar de dor, do inédito clichê "nem sabia que era possível vomitar de dor" e da descoberta da inédita pedra-nos-rins-de-três-milímetros-que-faz-vomitar-de-dor.
Sou grata por tudo que o verão levou embora mas, mais que isso, pelo que de encantador e enigmático me trouxe. Uma literatura inesperada, elogios que pareceram incontidos, bijuterias, trufas e tortas de frango, conversas a serem esquecidas, beijinho de quando se tem nove anos, seduções disfarçadas, banco de carro, sonhos esquisitos, projeções dilaceradas, miojos e caipiras na sexta-feira. Festas. Bolhas nos pés. E cantorias, no sereno ou não, vendo nascer os dias seguintes.
Cada estação é dona de suas próprias possibilidades. Se a que passou era a da perdição, que a que chegue seja a do encontro. Não o encontro do que foi perdido e dificilmente encontrará o caminho de volta, mas de tudo aquilo que aguarda e espera por mim, que já está escrito, se é que algum destino se escreve antecipadamente. Do contrário, que eu saiba escrevê-lo.
Que o outono seja um circuito a duzentos quilômetros por hora em que tudo que exista de verdadeiro e de melhor corra ao meu lado, e que o que peca pelo excesso, pelas mentiras e re-mentiras, pela mornidão ou pela dúvida não me alcance. Que as surpresas me ultrapassem só pra me ver passar de novo, na efêmera circunstância de quem está sempre desesperado pela entrega e para a satisfação de atravessar etapas.

2 comentários:

Bobs disse...

Parabéns pelo blog! Você escreve incrivelmente bem! Realmente, estou impressionado com sua dedicação em manter o blog há tanto tempo e com tantos posts para fazer os outros pensarem. Eu mesmo possuo um blog há mais de ano com apenas uma meia dúzia de textos fraquinhos e tenho noção da dificuldade que é manter tamanho trabalho com tal qualidade. Fico até com vergonha de alguém tipo você passar por lá!
Você acaba de ganhar um leitor.
Um abraço!

Unknown disse...

Como pode um poetisa tão novinha, tão bela e imbuída de tanta emoção, adorei seu blog, visite o meu encontrodesonhos,blogspot.com