terça-feira, 4 de setembro de 2018

É tudo breu

Que ser iluminado eu tenho a impressão de ser, para supor que possa tirá-lo do mundo das trevas? Para supor que há um parafuso exato para dar duas apertadas e estará tudo resolvido, faltando apenas, como era no princípio agora e sempre, descobrir qual. Eles sempre vêm com defeito de fábrica, sabes. Ô, meu pai! Ninguém conserta a apatia! Volta pra Terra, lunática! Faço um tratado de 20 páginas sobre a queda brusca do império do ateu que deu like na publicação da gostosa sobre Deus. Ah, não, agora não dá mais. Deu pra mim. Releio sôfrega. Não me convenço. Vai que é a mãe doente fazendo miséria com as ideias do peão. Opa, ele curtiu mais três publicações seguidas: uma ilustração da campanha de prevenção ao suicídio, um frame de filme cult com frase filosófica e uma foto do Freixo. Eu não aguento mais migalha. Eu não aguento mais inventar o que ele quer dizer e não diz por algum motivo misterioso. Meu estômago ronca. Mastigo os farelinhos com um prazer sadomasoquista. É de dar dó. Eu não aguento mais tentar entender a minha compulsão por esta merda de homem inacessível que ele é. Por esta miudeza de macho, que não se apresenta. Eu não aguento mais a pouca mulher que eu acho que sou enquanto quase sucumbo à vontade de chamar. Comigo não, paixão. Tenho vontade de fazer um interrogatório militar, tortura e tudo, mas só encolho os braços. P o x a. E aqui vamos nós outra vez. Com todas as doideiras que foram projetadas na minha cabeça enquanto esperava um sinal que não vinha para supervalorizá-lo quando veio. O silêncio é uma couraça dura demais para transpor. Dou de ombros. Dou uma volta no quarteirão. E tomo um ar e um café. Vinte e dois cafés. Não passa completamente. Tenho taquicardia. Atravesso a rua. Ando de um lado pro outro, zureta, querendo berrar coisas desconexas com as mãos balançando pra cima da cabeça. Me nota, porra! Dessa vez é um diálogo meu com a futura camisa de força. Eu googlo o nome dele três vezes por semana. Não tem Facebook, este animal. Não tem Lattes. Não tem processo trabalhista. Porque deve ser um procurado da Interpol. Ou incluso no programa de proteção à testemunha. Deve ser o novo nobel da paz, se achando superior às criaturas mudanas e pesquisando o dia inteiro. Bato o pé irritante de ansiedade. Vou me matar de gastrite. Me jogo no chão do supermercado pra mamãe comprar ele pra mim. Roo as unhas. Não que isso seja uma novidade. Imagino a rotina dele enquanto a cidade amanhece, que é quando me sobra tempo. Uma tragédia em três atos. Amanhã vai ser outro parto acordar nesse mundão cheio de doido. E finjo que adivinho o que ele precisa pra poder fazer de conta que sou eu. Tateio às cegas. É tudo breu.

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