domingo, 18 de novembro de 2012

Deixa que deixem

Enquanto eu decidia o que queria ser quando crescer, bebia sôfrega um copo de suco de uva desproporcionalmente preparado. Um dedo de concentrado e todos os outros mililitros de água fria sem gelo. Não tinha gosto de nada. Nada que eu quisesse realmente beber ou que matasse a sede melhor que água.
Assisti a garrafa de plástico, azul, ir enchendo aos poucos na pia de metal prateado desde o antepenúltimo gole. Depois olhei pro lado e o chão da cozinha estava brilhando, mas não era de limpo. Derrubei uns três litros de óleo por descuido trinta minutos antes e não houve pano, esponja, desengordurante, joelho no chão ou detergente que vencesse de todo aquele líquido viscoso e amarelo que pareceu entranhar em cada fresta. 
Deixa pra lá, deixa pra lá. Limpe a sujeira e deixe pra lá. Foi o que me repeti todas as vezes que algo caiu ou quebrou de repente, nos últimos anos. O segredo de deixar pra lá era desfrutar da euforia e do tédio como se fossem a mesma coisa... Matéria indispensável da qual a outra não sobrevive se uma não existir. Como banho de chuva e um estágio demasiado formal ou como a melancolia e o desatino.
E parecia que os pensamentos não tinham muito nexo quando decidi, concluindo apressada em mais um textinho fast food, pra ser consumido em minutos, que quando crescesse a única coisa que eu queria ser era melhor do que sou agora.

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