segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

O apressar do atraso

E já no acordar lembrei da minha mania de começar os textos com um E, para parecer mais familiar o que vem depois. Para ser só uma adição ao texto que fora escrito até a noite anterior, não uma nova página. Não lembro da gramática do E, embora adição me seja um termo meio que matematicamente familiar. Lembro apenas de acordar como se fosse personagem de livro de romance, meio cafona. Hoje narrei tudo que senti acontecer. Narrei os parágrafos, como começar, onde usar as vírgulas, ainda que de maneira inadequada. E na ressaca de iniciar as frases sem saber como acabarão, quando vi acordei na segunda-feira; Pensando porquê diabos algumas pessoas só conseguem escrever pra falar, ainda que minimamente, de amor. Ainda que com todos os eufemismos que a palavra e o viver requerem, para não falar no sentir. Todo o trajeto da náusea com que acordei, das páginas do livro que li, do almoço que não consegui terminar, do banho mais curto que o desejado, da escolha da pior roupa do armário aliada a um chinelo de dedos, que seria uma vestimenta ruim até para ficar em casa, do caminho para o trabalho na calçada que o dono do prédio resolveu cobrir de piso claro demais e que me cegaria, não fosse o atrasado da hora. Da sincronia dos passos subindo a elevação pequena que vai dar no meu trabalho, os clac clacs de salto da loira do segundo andar comparados ao meu arrastar de chinelos. Do boa tarde cuidadosamente seco, porém sonoro, ao adentrar as salas dos colegas que eu não via desde a sexta-feira. Da falta de paciência com a senhorita que precisa de ar condicionado e sal debaixo da língua porque está com pressão baixa. Pseudo-burguesa, sem o traço doce de ser, ao menos, uma hipocondríaca um pouco interessante. Do subir de escadas arrastado, para trabalhar, ou escrever um texto enquanto se deveria estar trabalhando. Tudo isso renderia uma crônica, um conto, um texto esparso, um monólogo, um livro detalhistamente enjoativo, um filme de pouca bilheteria; mas eu só consigo falar bem das coisas grandes, e essas não rendem nada, porque todos conseguem vê-las de alguma forma. Só consigo falar bem de me repetir com essa náusea que nem ao me deixar me deixa verdadeiramente. Dessa ressaca que as vodcas de ontem não conhecem. Dessa espécie de mordida em punho de camiseta comprida, que agonia tanto e o menino não se cansa de repetir. E eu me assisto ser o que não sou sem estar pertubada. Perturbadazinha que fosse. Nos meus textos que, ninguém, entendo. Falta o confirmar de coincidências, o apressar do atraso, o apreço de, entre uma loucura e outra, terminar sabendo que o próximo fruto da escrita merecerá começar com E, para ser continuação em vez de parágrafo novo.

Um comentário:

Um brasileiro disse...

Oi. Tudo blz? Estive aqui dando uma olhada. Interessante. Apareça por la. Abraços.