domingo, 31 de maio de 2015

Estive há |0|4| dias sem chorar por amor

Choveu até quarta-feira, depois fez frio. Engolia seco, pela primeira vez, o fim de um relacionamento. Ouvi Ana Carolina, Leoni, Legião, Engenheiros, Los Hermanos, ouvi sertanejo. Contei a história a uma dezena de pessoas que me perguntaram sobre ela. Nenhuma lágrima. Ouvi "Devolva-me", da Adriana Calcanhotto, e nada.
Passei os quatro primeiros dias letárgica e isso me surpreendeu. Houve quem dissesse que eu tinha motivos, que toda dor é passível de sofrimento, que não posso comparar as situações, mas... Guinho perdeu Clarice há oito dias, aos vinte e nove anos, para uma tragédia. No início de uma vida a dois, com muita vontade de insistir para que desse certo, quem sabe para sempre. "A dor dele é descomunalmente maior", eu me dizia. "A dor do Guinho, calada, estanca qualquer outra que queira gritar ao redor". Cada um tem sua forma de reagir a uma perda, mas qualquer que seja ela, a reação do Guinho foi, por quatro dias, morfina para a minha.
A minha, que sempre foi derreter por qualquer contratempo. Talvez eu não tenha me permitido sofrer, com lágrimas, antes de esgotar todas as possibilidades de agir com praticidade. Não antes de providenciar a retirada das fotos da exposição e descartar a 3x4 da carteira, de dar cabo dos bilhetes, de entocar qualquer lembrança no fundo das gavetas, repetindo, incansável, o que me fez chegar até aqui: o fim, no fim.
Se contei o meu tempo seco e distante com tamanho mau gosto, é só porque a soma dos dias sem choro talvez significasse que, diante das circunstâncias, eu houvesse aprendido a voltar a rolar a pedra-coração ao topo da montanha, resiliente, por mais pesada que me parecesse, sem lastimar por mais que um dia os arranhões causados por sua última queda. Alguém tão próximo que ficou severa e eternamente ferido... Então foi em favor dele - e só em favor dele - que, por quatro dias, eu reconheci o direito de chorar por amor.
Na sexta-feira faltou a luz. Agradecida, chorei baixinho até dormir pensando que, se ninguém visse, eu poderia me permitir. Voltando à vida, lavando a alma para um recomeço. O fato é que, logo depois do fim, eu estive quatro dias sem chorar por amor. Como se diz nos discursos de alcoólicos anônimos e dependentes químicos, como se diz da chuva no nordeste, como nos letreiros que se encontra perto das polícias, nas rodovias.
Na sexta-feira, humana e sensível, com lembranças, água e sal, zerei o placar. Repito Fabíola Simões: "é esse sal que tempera a experiência linda e única que começa agora"...

2 comentários:

Unknown disse...

Perfeitas palavras Cau.

Tenfen disse...

Ficam as lembranças boas, lógico, mas acima de tudo, o que você leva é a experiência, é o aprendizado. Não repetir os mesmos erros e etc, etc, etc. O que importa no fim das contas é isso. Paz e sucesso pra você, "bro".