terça-feira, 2 de julho de 2024

Jogo de azar

"A arte é uma rede de comunicações no tempo.
Há subestações de alta potência:
Homero, Dante, Shakespeare, Bach, Goya...
E há fiações, fusíveis, parafusos, isolantes,
singelos e indispensáveis".
(Paulo Mendes Campos)


Se a arte fosse só uma rede de comunicações atravessando distâncias temporais não haveria essa obstinação de, pela eventualidade, contestar verso por verso - e para ontem - antes mesmo do fim dos dias úteis. Porque pouco importaria que a informação tardasse. A arte não só comunica. Faz melhor: diverte. Tangencia. Alimenta a compulsão. Vende a chance. Está em todo lugar. A arte é antes uma rede de cassinos, onde os mais adictos se escondem sob o pretexto de se comunicarem. Ou seria só esse parafusinho - a menos - que falta para finalmente nos teletransportarmos. Ou talvez a peneira - um pequeno filtro - sem a qual o que é feio e sujo e denso rapidamente entupiria os canos que garantem o bom funcionamento e fluência do mecanismo. Enquanto o brilho de metal antigo das esquadrias embota aos muitos, nada conserva o mesmo verniz de novidade e agitação que tem uma boa aposta. Desfeitos os vidros - ou janelas - destes cassinos na agonia de se publicar sem rascunho, não há muito mais o que fazer que se expor, viciados. Com pressa, ao relento, ignorando o sereno. Arriscando alto, até a escritura da casa - onde vive a família - em troca de todas as fichas, para tentar outro all-in. É deste outro tipo de jogo de azar que ofereço.