quinta-feira, 28 de maio de 2020

Vermelho também

Que quer dizer este entrelaçar de dedos que começa lento, senão que por dentro estamos ligeiramente prontos para gritar com o corpo um desejo? O que poderia dizer este contemplar do teto da sala sem nenhuma palavra, senão que já não estamos habituados a ocupar os silêncios com confissões ou significados? O que tem de mortal e nocivo numa boca entreaberta à procura? Como compreender este abraço quente e terno, que gruda? Como definir essa força impelindo um corpo contra o outro, se paira no ar uma despretensão absoluta de diagnósticos? E por falar em diagnósticos, que parte do veneno deste processo te contaminou? Que parte te acalma e tranquiliza? Qual é o gosto que deveria ter a saliva, se acordo de madrugada e sinto sede demais e de mais? O que é toda essa vontade de gozo, tão dedicada e direcionada? Que é este capricho de querer deixar fluir de fora para fora e ainda assim se abrir um pouco? Quantas metáforas se inauguram quando bem no fundo de mim há algo desconfortável capaz de ferir, e ainda assim insistimos?
Eu não sei. E encaro com graça que, pelo menos isso, não possa descobrir sozinha. Tem mesmo um quê de vingança contra a morte esta vontade de se permitir levitar na tentativa enquanto vive e eventualmente dançar em êxtase, arrebatado por um acerto, menor que seja. Então está certo: é mútua a confiança no potencial desta chance, seja lá o que encerre a descomplicação desta possibilidade.

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