quarta-feira, 6 de maio de 2020

Vícios

Beber fumar comer cheirar partir julgar jogar comprar poder. Mentir, meter, engrossar, fazer rir. Atenção. Reclamar. Repelir. Se vitimizar. Nesse tempo tão extremo, como usar os olhos dos outros de encarar as próprias fugas? Não, não falo de empatia, porque da fonte da compulsão bebemos todos, então fazer este exercício não tem muito a ver com a mera gentileza de se por no lugar das pessoas ao redor para compreendê-las bem. Este exercício está mais para um caminho de condescendência comigo mesma. É como dizer: olha, queridos, compartilhamos desta neurose universal chamada vontade de fugir da realidade, e por isso não há nenhuma hierarquia entre os nossos vícios. É uma pena que essa complacência não se sustente por muito tempo. É uma pena que a eleição destes mecanismos que cada um tem pra si seja um processo tão misterioso. Tem a ver com moral? É um produto do meio? Remete à infância? Renovamos os votos com os nossos vícios todos os dias? É curioso tentar pensar em como cada um escolhe domesticar sua ansiedade e sua frustração diante da vida. Talvez isso possa dizer mais sobre as pessoas do que elas suspeitam. Sendo "pessoas" este enorme balaio do qual não estou apartada e "não suspeitam" o equivalente a: talvez a gente deliberadamente não queira saber, porque não tem força pra conter.
Eu preferiria ter o superpoder de curar e ser curada do que o de nos perdoar.

Nenhum comentário: