domingo, 23 de agosto de 2020

Eco [20]

A presença da Laura na minha vida desde o início fez com que eu confrontasse as minhas obsessões. A incerteza me corroeu por dentro desde o primeiro instante, como talvez corroa a todos os amantes, mas a mim um pouco mais. A Laura me punha inseguro. Ou talvez a minha insegurança viesse de antes. E sempre que nascia a vontade de ser eu mesmo, nascia uma vontade gêmea de não sufocá-la. Não mostrar demais. Não ficar exposto. Também, é claro, de não dar a ela motivos para correr, como se eles não fossem chegar de qualquer maneira. Com a Laura eu quis ser bom e equilibrado como nunca. Quis esquecer todo meu cansaço de acreditar de novo. Quis inventar uma versão de mim mais descoladinha, que não vivesse a vida como se tudo que não tivesse a presença dela fosse apenas um intervalo entre um sorriso e outro e uma necessidade prática, feito amarrar os cadarços. Com a Laura eu quis saber ser um pouco mais lúcido. Quis ter chegado um pouco mais pronto. De um jeito que me permitisse, por exemplo, ouvir os conselhos dos meus amigos e discernir entre eles, de acordo com a minha própria cabeça e consciência, em vez de ficar como uma barata tonta esticada para os lados até um dia quem sabe se partir ao meio entre forças opostas que me mandavam, de um lado, ser eu, e de outro ser leve. Conselhos mesmo paradoxais para um sujeito como eu, que sempre adorou explodir de afeto, de vontade, de intensidade ou de loucura. Crendo que não perde quem dá amor, mas quem não sabe receber. De um modo que me fazia ir embora ao menor sinal de falta de reciprocidade. Mas com a Laura, não. Quando a Laura chegou eu já sabia que não era infalível. Já sabia que cada um dá o que pode. E a Laura sequer me permitia compreender qual das minhas faltas podia preencher. Acho que assim morremos antes de nascer. Ficamos mornos antes de nos queimar. O fogo abrandou antes da combustão. E tudo que a Laura foi capaz de conhecer foi o caos ruidoso da minha busca entre o que eu era e o que eu queria aprender a ser pra caber na vida dela.

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