quinta-feira, 12 de setembro de 2024

Triperalismo

Se guardarán tus tristezas
En un gran libro de sal
Se guardarán como agua
En la niebla del canal
Hasta que llegues a verme
Y ahí entre soles y estrellas
A tu bondad que es enorme
Y a tus internas bellezas
(Gustavo Pena)

Que palavra usar agora que a palavra vale pouco? Preciso inventar novas.
Sou a expoente primeira do Triperalismo. É dali, das tripas, que me saem as vontades, as lágrimas, os textos e a sensibilidade. Mas também é ali que se situa a filial de mim que tem nome fantasia: Melancolia. Onde se apuram e contabilizam num escritório de paredes apertadas, escuro e úmido, a portas fechadas, os preços pagos para manter o funcionamento da matriz: Alegria. As fendas ficam abertas - para que tudo entre, para que tudo possa sair. Pelo pátio da matriz zanza um cachorro sem raça que corre e corre e ladra e busca e se diverte mas sempre volta muito dolorido com os espinhos de um porco todos cravados no focinho - sem entender como foi capaz de (se) machucar tanto. Na filial, se alimenta de realismo mágico um elefante-baleia imaginário que cresce, cresce e, dobrado, não passa por baixo do vão dessa porta de ir embora quando deve. E pesa. Ainda outro dia, antes de dormir, me ocorreu a imagem de uma mãe sentada num banco de parque, displicente, sem reparar na criança aprendendo a brincar sozinha na gangorra. Queria os altos, mas não sabia administrar os baixos. Até entender que, para aquela brincadeira, precisava dois extremos: um de subir e outro de descer. Atrever-se a flutuar, só jogando pra cima o fardo que afunda. E então aproveitar os microssegundos até que caia de novo. Primaverar o blue e o gris em cores vivas, quentes, solares. Até lá, chorar na mesa de qualquer restaurante. Não se constranger de sentir, se é de sentir. Deixar as lágrimas se anunciarem como febre - para regular a temperatura dos sentidos, cozinhando em água quente e salmourada um caldo fino de temperar as bochechas com líquido
que verte
entre as durezas e belezas.